O Nobre caminho Óctuplo segundo Buda
Esse texto foi escrito com todo o cuidado e carinho por um autor convidado. O conteúdo é da sua responsabilidade, não refletindo, necessariamente, a opinião do WeMystic Brasil.
Os caminhos nobres segundo Buda ensinam o “caminho óctuplo”- um conjunto de oito práticas que representam a quarta nobre verdade do Budismo. Também é chamado de “caminho do meio”, já que se baseia em atitudes moderadas e harmônicas, fugindo sempre dos extremos.
O Nobre Caminho Óctuplo destina-se a ser um guia para todos os aspectos da vida. Deve ser implementado na vida diária para que a riqueza e o esplendor desses ensinamentos possam ser plenamente compreendidos. Praticado com diligência, o Nobre Caminho Óctuplo leva à mais maravilhosa compreensão. Ninguém, que pratique o caminho há bastante tempo, tem dúvidas quanto ao seu poder e sabedoria.
As 8 práticas do Nobre Caminho Óctuplo
O Nobre Caminho Óctuplo fundamenta-se na moralidade, crença e sabedoria, sendo o guia perfeito para os ensinamentos do Buda. A prática diligente desse caminho leva à iluminação perfeita.
1 – Compreensão Correta (Samyag-drsti)
Conhecer as Quatro Nobres Verdades do Budismo (existência sofrimento, causas do sofrimento, liberação do sofrimento, caminho para liberação) é uma forma de entender e aceitar as coisas da vida como realmente são. Isso vai incentivá-lo a se libertar e querer ajudar os outros a fazer o mesmo.
A Compreensão Correcta é colocada em primeiro lugar no Nobre Caminho Óctuplo porque funciona como a bússola de um navio – a sua função é evitar que percamos o rumo. Se tivermos a Compreensão Correcta, os restantes aspectos, assim como a vida, fluirão naturalmente. Nunca é demais salientar a importância da Compreensão Correcta. Se conseguirmos entender os ensinamentos básicos do Buda, saberemos sempre como, por que, quando e onde praticar o Dharma. Se a nossa Compreensão for Correcta, não nos perderemos facilmente.
Para a Compreensão Correta, é essencial se autoquestionar, principalmente a respeito do seu comportamento. A nossa tendência é gastar tempo justificando o que fizemos ou o que queremos fazer. Devemos tentar inverter o processo. Ao invés de tentar justificar nossas transgressões, devemos tentar aprender o que elas significam e transformá-las.
Nas profundezas da mente, apoie-se na pureza do Dharma. Em pouco tempo, os seus frutos supremos serão alcançados. (Sutra do Grande Nirvana)
2 – Pensamento Correto (Samyak-samkalpa)
Para o Pensamento Correto, devemos desenvolver a bondade amorosa, nunca ter má vontade em relação aos outros, não desejar o mal (mesmo em pensamento), evitar a avareza e por fim, não ser egoísta.
Mas, como é possível purificar as tendências de nossa mente? Devemos praticar a introspecção profunda. Realize em seu pensamento que todo o mal e todo o bem vêm de sua própria mente e você deve tentar equilibrar ao máximo o que passa nela. Um pensamento maldoso pode gerar uma sequência de consequências nocivas, enquanto um pequeno pensamento bom, pode trazer uma abundância de coisas boas.
Como purificar as tendências da mente? Através da introspecção profunda, contemple o fato de que a fonte de todo o bem e de o todo mal nada mais é do que a própria mente. Um simples pensamento maldoso pode produzir uma porção de consequências nocivas, ao passo que um simples pensamento bom pode gerar uma abundância de coisas boas. (Mestre Yongjia Xuanjue, 665-713)
3 – Fala Correta (Samyag-vac)
Para alcançar a Fala Correta você não deve mentir, falar em excesso, usar palavras ácidas ou caluniosas. O melhor caminho é falar sempre a verdade, dizer coisas construtivas, conciliadoras e harmoniosas. Existem quatro regras básicas para ter uma Fala Correta:
– Falar sempre a verdade;
– Medir se o que vai falar pode ofender alguém. Se suas palavras forem machucar uma pessoa, é melhor calar-se. Faça com que sua fala sempre espalhe bondade e gentileza;
– Encoraje as pessoas. Muitas vezes, tudo que alguém precisa é de uma palavra amiga e confiante. Caso você tenha a chance de elogiar, animar ou encorajar alguém não meça palavras. Isso pode fazer toda diferença para quem ouve;
– Seja prestativo com suas palavras. Usar a fala para ajudar os outros é sempre uma boa opção. Você pode utilizar as palavras para informar, ensinar e conversar com os outros sobre algo construtivo. É importante dialogar e argumentar com as pessoas sobre diferentes assuntos. Esta é a melhor forma de aprender o Darma.
Os que são sábios praticam a fala correcta, a fala suave, a fala harmoniosa e a fala verdadeira. Isso porque o uso da fala correcta nos livra da frivolidade, o da fala suave nos livra da rispidez, o da fala harmoniosa nos livra da duplicidade e o uso da fala verdadeira nos livra da mentira. (Mestre Yongjia Xuanjue, 665-713)
4 – Ação Correta (Samyak-karmanta)
A Ação Correta se refere a tudo que fazemos com o nosso corpo como ter bons hábitos de alimentação, dormir bem, praticar exercícios físicos e descansar adequadamente. Os hábitos de trabalho e tudo que se refere ao carma gerado pelo comportamento, também afetam a Ação Correta. Praticar o bem e não causar sofrimento aos outros vai contribuir para que você tenha uma vida equilibrada e plena.
Concentre totalmente a mente no Buda. Realize o potencial da natureza humana. Quando a natureza humana for realizada em todo o seu potencial, a budeidade será atingida. (Mestre Taixu, 1889-1947)
5 – Meio de Vida Correto (Samyag–ajiva)
Meio de Vida Correto, ou Profissão Correta, diz respeito à forma como ganhamos a vida. Isso pode ser problemático em meio às complexidades do mundo moderno. Meio de Vida Correto implica não fazer e não levar ninguém a fazer nada que viole os preceitos do budismo. Todo trabalho deve estar na maior sintonia possível com os ensinamentos do Buda. Nossa ocupação não deve prejudicar ninguém, nem tampouco incentivar que outra pessoa o faça. O Buda Shakyamuni viveu em uma sociedade muito diferente da nossa. A despeito disso, ele relacionou duas especificidades relativas ao trabalho que ainda são válidas para os budistas de hoje:
- Não ter casas de jogos, bares, bordéis ou matadouros.
- Não caçar, pescar ou exercer profissão que envolva matança de animais.
O trabalho que fazemos neste mundo produz muitas sementes cármicas. O budismo é conhecido como Caminho do Meio porque o Buda sempre ensinou seus seguidores a evitar extremos em tudo – equilíbrio e discernimento são aspectos fundamentais da sabedoria. Assim, ao analisar nossa ocupação e comparar o que fazemos com as verdades do Darma, é preciso nos certificar de que não estamos sendo radicais em nossas interpretações.
6 – Esforço Correto (Samyak–vyayama)
Depois de ter colocado a vida em ordem, ou seja, quando tivermos Compreensão Correta, Pensamento Correto, Fala Correta e Meio de Vida Correto, naturalmente passaremos a fazer o Esforço Correto.
Esforço supõe mudar para melhor, tornar-se mais sábio, calmo e moralmente correto. Com Esforço Correto, entendemos melhor o Darma a cada dia que passa e aprendemos a aplicá-lo mais e mais em nossa vida.
Na prática do budismo, como em tudo, manter a regularidade é importante. Se nos tornarmos preguiçosos ou desatentos, começaremos a regredir. O Darma contém tesouros profundos, sendo impossível sondar sua dimensãoem pouco tempo. Devemos nos engajar nos ensinamentos do Buda e, de forma regular e gradual, aprender a valorizar a vastidão do Darma e a sabedoria do Buda. Nossa sabedoria se ampliará enquanto permanecermos próximos do Darma, permitindo que este indique como devemos nos comportar. O Tratado sobre a Perfeição da Grande Sabedoria sugere quatro formas de esforço correto:
- Manifestando a bondade onde ela não existe;
- Fomentando a bondade onde ela existe;
- Não manifestando o mal onde este não existe;
- Extinguindo o mal onde este existe.
7 – Atenção Correta (Samyak–smrti)
Atenção Correta significa encontrar dentro de si a pureza inerente à mente búdica e nela permanecer, não permitindo que essa pureza seja obscurecida pelos venenos da cobiça, da raiva e da ignorância.
A Atenção Correta advém dos seis primeiros aspectos do Nobre Caminho Óctuplo. Ela é uma parte pura nossa, que se expande continuamente à medida que praticamos o Darma. O Sutra dos Ensinamentos Legados pelo Buda diz: “Se nossa Atenção Correta for firme, poderemos até penetrar no perigoso mundo dos Cinco Desejos sem que nenhum mal se abata sobre nós. É como usar uma armadura numa batalha – não há nada a temer”.
Os budistas devem sempre privilegiar a Atenção Correta em detrimento do raciocínio iludido. Se a nossa Atenção é correta não seremos abalados pelas falsas distinções da dualidade. Não cairemos na ilusão das oposições nós/outros, perda/ganho, vida/morte. A Atenção Correta nos ensina a manter a consciência de que as coisas são como devem ser e que tudo o que podemos fazer é trazer um pouco mais de bondade a este mundo.
O Buda ensinou quatro contemplações para nos ajudar a conquistar e manter a Atenção Correta – um estado em que não há apego a nenhum dos incessantes caprichos da ilusão. As contemplações apresentadas a seguir destinam-se a nos auxiliar no esforço de nos libertar da fascinação pelo mundo da ilusão. Depois de eliminado esse fascínio, começaremos a perceber a pureza e a beleza que repousam no âmago da Atenção Correta. As contemplações da Atenção Correta são mostradas a seguir:
- Contemplação da impureza. Uma das causas mais fundamentais do apego das pessoas à ilusão é o grande amor que nutrem pelo corpo. Uma quantidade enorme de cobiça e raiva surge do amor ao corpo. O corpo deve ser cuidado e não deve ser maltratado; porém, não podemos condescender com ele. Todos devem se conscientizar plenamente de que o corpo vai um dia adoecer e morrer. Mesmo saudável, o corpo é repleto de excreções, alimento semidigerido, muco, linfa, sangue, urina e muitas outras substâncias que são, essencialmente, impuras. O Buda ensinou a contemplar a impureza do corpo para nos ajudar a superar o apego a ele. O objetivo dessa contemplação não é nos causar repulsa, mas ajudar a nos libertar do apego ao mundo da carne.
- Contemplação do sofrimento. Contemple que todas as sensações são dolorosas ou levam à dor. Esta contemplação volta a enfatizar a Primeira Nobre Verdade. Independentemente do que aconteça conosco, no fim das contas, ninguém consegue escapar do sofrimento causado pelas verdades da impermanência, da doença, da separação dos entes queridos e da morte. O Buda Shakyamuni exortava seus seguidores a encarar esta verdade de frente, sem dela se afastar. O Darma fundamenta-se na inerente insatisfação da vida neste mundo. O Príncipe Sidarta, que veio a se tornar o Buda, deixou a casa de seu pai para buscar a iluminação depois de compreender plenamente a inevitabilidade do sofrimento neste mundo.
- Contemplação da impermanência. Contemple a impermanência e a inconstância dos pensamentos. Os pensamentos vêm e vão com rapidez quase inconcebível e muito menos controlável. Em um momento estamos no paraíso, no seguinte vemos as portas do inferno abrirem-se diante de nós. Nada disso é permanente. Nada disso se mantém. A mente movimenta-se incessantemente pelas condições desorganizadas do mundo sensorial. Contemplando as fragilidades e inconstâncias de nossos próprios pensamentos, ensinamo-nos que todas as coisas são impermanentes e que nada que possamos conceber dura para sempre.
- Contemplação do “não eu”. Contemple a inexistência de uma natureza individual permanente e imutável em tudo e em todos.
O Sutra Vajracchedika-prajñaparamita (Sutra Diamante) diz: “Todos os darmas condicionados são como sonhos, como ilusões, como bolhas, como sombras, como orvalho, como relâmpagos e todos eles devem ser dessa forma contemplados”. Darmas condicionados são as coisas deste mundo, inclusive aquelas que estão em nosso pensamento e em nossa imaginação. O Buda disse que todos eles são “como relâmpagos ou como orvalho”. Nenhum persiste e nenhum é, em última análise, real. Nenhum tem natureza própria. Nenhum está imune às mudanças.
Quando todas as ilusões são extintas, o que não é ilusório não se extingue. É como limpar um espelho: quando a poeira é eliminada, aparece a claridade. (Sutra da Iluminação Plena)
8 – Concentração Correta (Samyak–samadhi)
A prática budista tem como alicerces a moralidade, a meditação e a sabedoria. Fala Correta, Ação Correta, Meio de Vida Correto e Esforço Correto objetivam ajudar-nos a melhorar moralmente. Compreensão Correta, Pensamento Correto e Atenção Corretas por sua vez, pretendem nos tornar se não sábios, pelo menos um pouco mais sábios.
Concentração Correta é ferramenta para aprendermos a meditar e nos beneficiar com a meditação. A tranquilidade e a paz encontradas na meditação são os alicerces da sabedoria budista. Em sânscrito, o termo para concentração é samádi, que designa um estado profundo de concentração ou um estado profundo de equilíbrio meditativo. A base de qualquer meditação é a concentração. Quando aprendemos a nos concentrar longa e profundamente nas verdades imutáveis do budismo e começamos a descobrir sua plenitude em estados mentais que existem para além da linguagem, estamos praticando a Concentração Correta.
A paz e a pureza que são descobertas no samádi, quando corretamente aplicadas à vida, trazem enormes benefícios para nós e para as pessoas com as quais temos contato. Em termos gerais, a meditação deve promover melhor saúde física, ensinar-nos a tranquilidade, auxiliar-nos a ver mais claramente – o que significa iluminar-se – e, finalmente, mostrar-nos o esplendor de nossa inerente natureza búdica. A meditação deveria promover um comportamento social saudável e prestativo e não nos tornar depressivos ou antissociais.
Se, meditando no Buda, perceber que a sua mente não está calma e unificada, deixe que ela se recolha em si mesma e ela ficará tranquila e unificada. A melhor forma de fazer isso é pelo esforço puro e sincero. Quem não for sincero não terá êxito. (Mestre Yinguang, 1862-1940)
Saiba mais :